domingo, 27 de novembro de 2011

O MENINO DE RUA E A IMPORTÂNCIA DO ESQUECIMENTO



Era uma manhã ensolarada de um dia de semana no subúrbio do Rio de Janeiro. Esperava o ônibus que me levaria de volta à minha residência após ter resolvido uma situação bastante complicada. O trânsito apresentava um grande engarrafamento em sentido contrário ao que eu desejava me dirigir, mas, o meu ônibus não vinha.

Ouço então um alvoroço do outro lado da rua e consigo ver os momentos finais de um roubo praticado por alguns meninos, que derrubam uma senhora e correm em vários sentidos. Um deles atravessa a rua e vem na minha direção. O menino, porém, não consegue alcançar seu intento de fuga, é atingido por um veículo e cai desfalecido no asfalto quente.

Aproximo-me e vejo que ele sofrera uma violenta pancada na cabeça, estava desacordado, mas vivo. Outras pessoas se acercam e começam então a proferir diversos impropérios.

_ Ele é um “trombadinha” _ Diz um senhor.

_Teve o que mereceu, pois, vive roubando. _ Profere outro cidadão exaltado.

Impeço que removam o menino do meio da rua, sob a argumentação de que era preciso liberar o trânsito. Afirmo que não é correto mover o menino sem os devidos recursos.

Com a chegada da polícia ficamos sabendo que o socorro já fora providenciado. Logo uma ambulância chega e inicia o trabalho de atendimento. O ônibus que eu aguardava também chega, e eu embarco, seguindo minha vida sob a forte impressão de tão doloroso quadro e a imagem daquele menino de apenas aproximadamente 10 anos.

A cada dia bastam seus sofrimentos, e logo outras situações passam a concentrar minha atenção, aquele foi apenas mais um quadro triste e de violência no mundo em que vivemos.

Alguns dias depois, na Unidade hospitalar aonde trabalhava, recebo a solicitação de fazer um atendimento na enfermaria de crianças. Para minha surpresa encontro o menino de que presenciei o atropelamento. Estava ele num quadro quase vegetativo, mas esboçava reação de dor aos movimentos que o seu tratamento lhe impunha, assim como era evidente a sua sensação de alívio diante do afago no rosto que a profissional de enfermagem lhe fazia.

Pergunto onde está a acompanhante do menino. A enfermeira me diz que ele não tem nenhum familiar a lhe acompanhar, e que nem mesmo seu nome é conhecido. Observo então que no Prontuário estão as iniciais M.N.N.I (MENINO NEGRO NÃO IDENTIFICADO).

Ele não tem nem nome, murmurei, falando comigo mesmo.

_Nós já lhe demos um nome, ele agora é MATEUS _ respondeu a profissional que lhe arrumava as vestes e cobria com o lençol, posicionava o travesseiro e dava a “MATEUS” o conforto possível para quem se encontrava naquela situação. Os dias foram passando e os cuidados e “chamego” de vários profissionais deram a Mateus um ar de menino bem cuidado, limpo, penteado, alimentado. A fisionomia continuava a evidenciar que ele estava “sereno” “protegido”. Que todo aquele amor e atenção, que certamente ele não recebia nas ruas, lhe faziam muito bem. MATEUS teve festa de Natal, e recebeu até presentes. Deram-lhe um cata-vento, que posicionado no pé da cama hospitalar, girava sob o impulso do vento artificial de um ventilador. Ele olhava e esboçava um tênue sorriso.

Mas, a saúde de MATEUS também era tênue, o impacto do automóvel lhe causou sérios comprometimentos, que desaguaram em um problema pulmonar que não pode ser superado. MATEUS desencarnou.

Certamente os três últimos meses de sua encarnação, foram, apesar de vividos numa cama hospitalar com a sua lucidez e a orientação reduzidas, especiais para o MATEUS.

Ele teve um nome, carinho, cuidado, amor, e, ainda que de forma imposta pelo violento acidente, a sua participação em atos violentos fora interrompida, e ele retribuiu com sorrisos e pequenos gestos de simpatia e doçura, todo o bem querer que tiveram as pessoas que dele cuidaram.

Sob as luzes da Doutrina Espírita, podemos ver diversas lições no presente relato:

A importância do esquecimento do “passado”, como forma de viver no presente uma relação sem vinganças ou cobranças indevidas. Cuidariam de MATEUS, com o mesmo carinho e simpatia, caso soubessem que ele era um MENINO de RUA, “trombadinha”, ou, apenas lhe dedicariam os cuidados meramente profissionais?  Tal esquecimento é necessário nas questões relativas às encarnações passadas, sem ele, seria impossível conviver na condição de familiar e amigo, a quem se devota os melhores esforços para proteger, educar, amar, se soubéssemos que ali se encontra alguém que no passado, nos foi motivo de sofrimento e queda.

Importante ainda pensar que, os momentos de dor e limitação física, que em muitas oportunidades antecedem ao desencarne, servem de importante estágio preparatório para que a alma, chegando ao plano espiritual em condições de menor perturbação, e, vergada em suas imperfeições de orgulho e soberba, possa receber com humildade e de forma mais fácil, a ajuda dos amigos espirituais.

A misericórdia Divina deu ao menino de rua, noventa dias para que ele passasse de M.N.N.I à condição de MATEUS. Certamente foi acolhido de outra forma em seu desencarne.

SUGESTÃO DE TEMA PARA ESTUDO
O LIVRO DOS ESPÍRITOS - CAP. III - CAP. VII
O EVANGELHO SEG. O ESPIRITISMO - CAP. IV - CAP. X

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COMUNICADO

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